Texto I
Se pensarmos o Brasil a partir da cosmologia e
da história indígenas, veremos como o país é múltiplo e nele coexistem maneiras
distintas de pensar e de viver. As experiências e os saberes indígenas
consideram o universo em sua totalidade e inserem o ser humano em uma complexa
rede de relações que envolvem os seres (naturais e sobrenaturais). Essa
cosmologia não se confunde nem pode ser contida dentro da lógica materialista e
mercadológica, com a qual estamos habituados. Do ponto de vista ocidental - centrado na razão europeia – as formas de
conhecimento e de expressão indígenas estariam em desvantagem, pois ainda
seriam vistas como menos complexas, menos científicas, mais primitivas. Desse ponto
de vista, seriam lógicas superadas, que deveriam ceder lugar à verdadeira razão
e à verdadeira ciência. (...) Na atualidade, diversos campos das Ciências
Sociais têm realizado uma crítica à ideia que coloca a vida indígena como obsoleta
– a principal crítica é a de que a racionalidade econômica afirma a primazia
total do mercado e que, assim, coloca em segundo plano o bem estar das pessoas
e a proteção do meio ambiente. A lógica do mercado é a que sustenta os atuais
projetos e medidas governamentais. A partir dessa lógica, tudo se converte em
recurso – a natureza, o conhecimento e a criatividade humanas, tudo pode ser
capitalizado para se tornar lucrativo.
BONIN,
Iara. Disponível em: https://cimi.org.br/cosmovisao-indigena-e-modelo-de-desenvolvimento/.
Acesso em 30 out.2025. Adaptado.
Texto II
Aos 66 anos, Ailton Krenak – líder indígena, ambientalista, filósofo e escritor brasileiro, conhecido por sua luta pelos direitos dos povos indígenas e pela preservação ambiental – segue resistindo. Krenak circula pelo mundo, orientado pela intuição e pelos sonhos, com a urgência de traduzir para os brancos fragmentos da cosmovisão dos povos indígenas. “Quando os índios falam que a Terra é nossa mãe, isso não é poesia – é a nossa vida. Estamos colados no corpo da Terra. Quando alguém fura, machuca ou arranha a Terra, desorganiza o nosso mundo”, diz Krenak, em entrevista à Revista Cult. (...) Tem um povo que vive na região do vale do Mucuri, em Minas Gerais, na bacia do rio Doce – os Maxacali. Eles são vizinhos dos Krenak. Nosso território e nossas florestas foram devastados. O gado entrou lá no começo do século 20. As únicas coisas que os mineiros sabiam fazer eram derrubar mata, botar boi e fazer garimpo. Nossos parentes Maxacali continuam até hoje, cercados por todas aquelas fazendas, moídos pela violência colonial em volta deles. Eles dão nome às plantas e aos animais que existiram naquela paisagem, antes de ela ser destruída. Cantam para eles, invocam a presença deles e criam um mundo animado para poder habitar. (...) Esse mundo pragmático em que a gente coexiste é um lugar de passagem de outros povos, outras mentalidades e outras culturas. E não existe só este mundo de concreto, ruas e cidades, que imprime no corpo da Terra a marca dos homens, como se eles fossem a única existência inteligente e sensível. Se você perguntar aos sábios indígenas: ‘o que quer dizer o nome do seu povo?’, eles vão dizer ‘nós’, desmantelando a ideia de indivíduo, e dando a oportunidade de conversarmos com o rio, com a montanha, com outros seres que não são os humanos. Os brancos elegeram este lugar como se fosse um clube. E, se você quiser fazer parte desse clube, vai reforçar a predação do planeta, andando pelo mundo como se fosse a única inteligência viva da Terra. É isso o que tem sido denunciado como uma espécie de humanidade-zumbi, uma humanidade petrificada que nem sabe o que está fazendo, e continua fazendo. É uma mentalidade que também é alimentada por uma cosmovisão. (...) Os norte-americanos brancos que foram colonizar o norte da América, agentes colonizadores do planeta, também têm uma cosmovisão, que é emoldurada pela ideia da mercadoria que o capitalismo imprimiu na mente e no coração das pessoas. Hoje, a principal religião do mundo é o capitalismo. O deus [dos brancos] é a mercadoria.”
MASSUELA, Amanda
WEISH, Bruno. Disponível em: https://revistacult.uol.com.br/home/ailton-krenak-entrevista/.
Acesso em 30 out.2025. Adaptado.
CONTEXTUALIZAÇÃO: Como você sabe, a “cosmovisão” refere-se ao modo como uma pessoa ou um grupo
de pessoas enxerga e interpreta o mundo ao seu redor – a cosmovisão abarca valores,
crenças, princípios e perspectivas sobre a realidade, a existência humana, a
natureza e o propósito da vida.
COMANDO: Com base nas leituras, escreva uma LENDA. Para tanto, imagine que você seja um sábio indígena, conhecido como “o
guardador de histórias”. Imagine, ainda, que as crianças da aldeia tenham
pedido a você para contar-lhes a alternância das estações, que têm conexão com o
clima, a agricultura e as festividades.
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