A propósito do racismo na obra de Lobato e de
registros de seu posicionamento frente à questão, há muito debate sobre qual
seria a solução mais adequada para lidar com esse aspecto de sua produção
literária (...). O melhor é manter os trechos de cunho racista, acrescentando
notas que os contextualizem? Suprimi-los, eximindo leitores ainda muito jovens
do contato com esse tipo de manifestação? Ou simplesmente esquecer o autor? Em
2020, uma das descendentes do escritor optou pelo segundo caminho. Cleo
Monteiro Lobato decidiu organizar e traduzir para o inglês uma versão
"atualizada" de "Narizinho Arrebitado", primeira história
presente no livro "Reinações de Narizinho". O livro adaptado foi
publicado pela Underline Publishing no Brasil e nos Estados Unidos, onde a
bisneta do escritor reside desde a década de 1990. Até o ano que vem, as demais
histórias do livro também devem ser lançadas separadamente pela editora, com o
mesmo tipo de adaptação. (...) Para Cleo Monteiro Lobato, as mudanças são
necessárias para que o bisavô continue sendo lido pelas novas gerações. "A
gente evoluiu como sociedade, não dá pra parar no tempo. Monteiro Lobato
escreveu entre 1920 e 1930, a última revisão [da obra] que ele fez foi em 1947
e de lá pra cá a evolução foi muito grande", disse a bisneta do autor a
Ecoa. "Quem quiser ler a obra original pode escolher. Mas eu gostaria de
atingir um novo público, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos. Realmente
acho que tem que se olhar pra frente, Monteiro Lobato era um cara à frente do
seu tempo, e eu acho que se ele estivesse vivo ele estaria fazendo essa
revisão."
LIMA,
Juliana Domingos de. Disponível em: https://www.uol.com.br/ecoa/ultimas-noticias/2021/03/12/bisneta-de-lobato-adaptou-trechos-problematicos-de-obra-veja-comparacao.htm.
Acesso em 28.jun.2022.
A revista Dados, publicação acadêmica editada pelo
Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipesp-Uerj), resgata na edição 56, a
polêmica de 2010, em torno das obras infantis do escritor Monteiro Lobato.
Artigo assinado pelos professores João Feres Júnior, Leonardo Fernandes
Nascimento e Zena Winona Eisenberg não deixa dúvidas: os contos escritos por
ele disseminam preconceito. Lobato, um influente autor brasileiro do século 20,
era racista de perigosa influência nos bancos escolares, consumido com avidez pelas
crianças. (...) Vetar a publicação? Nunca. Os pais têm o direito de comprar as
obras do autor e, com elas, presentear os filhos. Pelo aniversário ou por
qualquer outra razão. Mas o poder público não pode propagar a visão racista de
Monteiro Lobato.
O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal
(STF), negou pedido de liminar para suspender a distribuição, em escolas
públicas, do livro Caçadas de Pedrinho, de Monteiro Lobato, obra publicada em
1933. O ministro rejeitou pedido do Instituto de Advocacia Racial (Iara), por
entender que não cabe ao Supremo julgar mandado de segurança contra ato do
Ministério da Educação (MEC). O instituto alegou que a publicação apresenta
conteúdo racista. O caso começou a tramitar no Supremo em 2011. Uma audiência
de conciliação chegou a ser feita pelo ministro, mas não houve consenso entre o
MEC e o instituto. Em 2010, o Conselho Nacional de Educação (CNE) determinou
que uma obra Caçadas de Pedrinho não fosse mais distribuída às escolas
públicas, por considerar que ela realmente apresentava o conteúdo racista. Em
seguida, o MEC recomendou que o CNE reconsiderasse uma determinação. O conselho
decidiu, então, anular o veto. Em decisão recente, o ministro Toffoli
determinou que os autos recebidos ao STJ para julgamento. Fala-se hoje na
reedição da obra “A Menina do Narizinho Arrebitado” pela bisneta do autor. Não
se nega a importância da obra de Monteiro Lobato, que perpassa várias gerações.
Uma revisão de Cleo Monteiro Lobato alterar ou suprimir “passagens
problemáticas”, como a que se referia a Tia Nastácia como “negra de estimação”.
(...)
Será importante fazer essa censura em trechos
considerados racistas numa obra? O exercício é fútil. A literatura tem, entre
suas funções, a de documento histórico de uma época e do pensamento de seu
autor. (...) Não se pode destruir um legado intelectual. Se assim fosse
estaríamos, no Brasil, a destruir, de forma bárbara, músicas como “O seu cabelo
não nega”, dentre outras, de Lamartine Babo. Então não vou ler uma obra de
Heideger porque ele admirava ideias nazistas? Ora, isso é bestial. Não se pode
analisar o passado com olhar do presente.
PROPOSTA DE REDAÇÃO: A partir do material de
apoio e com base nos conhecimentos construídos ao longo de sua formação, redija
um texto dissertativo-argumentativo, em norma padrão da língua portuguesa, sobre
o tema: “A literatura de Monteiro Lobato em xeque: racista ou representativa de
uma época?” Apresente proposta de intervenção social que respeite os direitos
humanos. Selecione, organize e relacione, de maneira coerente e coesa,
argumentos e fatos para defesa de seu ponto de vista.