FUVEST 2015 - CAMAROTIZAÇÃO DA SOCIEDADE BRASILEIRA
FUVEST
CAMAROTIZAÇÃO DA SOCIEDADE
FUVEST/2015
ID: DT5
TEXTOS DE APOIO
Na verdade,
durante a maior parte do século XX, os estádios eram lugares onde os executivos
empresariais sentavam-se lado a lado com os operários, todo mundo entrava nas
mesmas filas para comprar sanduíches e cerveja, e ricos e pobres igualmente se
molhavam se chovesse. Nas últimas décadas, contudo, isso está mudando. O
advento de camarotes especiais, em geral, acima do campo, separam os abastados
e privilegiados das pessoas comuns nas arquibancadas mais embaixo. (…) O
desaparecimento do convívio entre classes sociais diferentes, outrora
vivenciado nos estádios, representa uma perda não só para os que olham de baixo
para cima, mas também para os que olham de cima para baixo. Os estádios são um
caso exemplar, mas não único. Algo semelhante vem acontecendo na sociedade
americana como um todo, assim como em outros países. Numa época de crescente
desigualdade, a “camarotização” de tudo significa que as pessoas abastadas e as
de poucos recursos levam vidas cada vez mais separadas. Vivemos, trabalhamos,
compramos e nos distraímos em lugares diferentes. Nossos filhos vão a escolas
diferentes. Estamos falando de uma espécie de “camarotização” da vida social.
Não é bom para a democracia nem sequer é uma maneira satisfatória de levar a
vida. Democracia não quer dizer igualdade perfeita, mas de fato exige que os
cidadãos compartilhem uma vida comum. O importante é que pessoas de contextos e
posições sociais diferentes encontrem-se e convivam na vida cotidiana, pois é
assim que aprendemos a negociar e a respeitar as diferenças ao cuidar do bem
comum.
Michael J. Sandel. Professor da Universidade Harvard. O que o dinheiro
não compra. Adaptado
Comentário do
Prof. Michael J. Sandel referente à afirmação de que, no Brasil, se teria
produzido uma sociedade ainda mais segregada do que a norte-americana:
O maior erro é
pensar que serviços públicos são apenas para quem não pode pagar por coisa
melhor. Esse é o início da destruição da ideia do bem comum. Parques, praças e
transporte público precisam ser tão bons a ponto de que todos queiram usá-los,
até os mais ricos. Se a escola pública é boa, quem pode pagar uma particular
vai preferir que seu filho fique na pública, e assim teremos uma base política
para defender a qualidade da escola pública. Seria uma tragédia se nossos
espaços públicos fossem shopping centers, algo que acontece em vários países,
não só no Brasil. Nossa identidade ali é de consumidor, não de cidadão.
Entrevista. Folha de S. Paulo, 28/04/2014. Adaptado.
[No Brasil, com o
aumento da presença de classes populares em centros de compras, aeroportos,
lugares turísticos etc., é crescente a tendência dos mais ricos a segregar-se
em espaços exclusivos, que marquem sua distinção e superioridade.] (…) Pode ser
que o fenômeno “camarotização”, isto é, a separação física entre classes
sociais, prospere para muitos outros setores. De repente, os supermercados poderão
ter ala VIP, com entrada independente, cuja acessibilidade, tacitamente, seja
decidida pelo limite do cartão de crédito.
Renato de P. Pereira. www.gazetadigital.com.br, 06/05/2014. [Resumido] e
adaptado.
Até os anos de
1960, a escola pública que eu conheci, embora existisse em menor número, tinha
boa qualidade e era um espaço animado de convívio de classes sociais
diferentes. Aprendíamos muito, uns com os outros, sobre nossas diferentes
experiências de vida, mas, em geral, nos sentíamos pertencentes a uma só
sociedade, a um mesmo país e a uma mesma cultura, que era de todos. Por isso,
acreditávamos que teríamos, também, um futuro em comum. Vejo com tristeza que
hoje se estabeleceu o contrário: as escolas passaram a segregar os diferentes
estratos sociais. Acho que a perda cultural foi imensa e as consequências, para
a vida social, desastrosas.
Trecho do testemunho de um professor universitário sobre a Escola
Fundamental e Média em que estudou.
PROPOSTA: Os três
primeiros textos aqui reproduzidos referem-se à “camarotização” da sociedade –
nome dado à tendência a manter segregados os diferentes estratos sociais. Em
contraponto, encontra-se também reproduzido um testemunho, no qual se recupera
a experiência de um período em que, no Brasil, a tendência era outra. Tendo em
conta as sugestões desses textos, além de outras informações que julgue
relevantes, redija uma dissertação em prosa, na qual você exponha seu ponto de
vista sobre o tema: “Camarotização” da sociedade brasileira: a segregação das
classes sociais e a democracia.